sábado, 22 de dezembro de 2012

HOJE ACORDEI MEIO DIA

{Cassiane Schmidt}

Respirei dois goles de saudade
Fechei as cortinas
Quero mudar de cidade...

Sou avessa à rotina
Não gosto dessa coisa de estar sozinha
Solidão não é plural de gente
Se fosse assim as multidões seriam contentes

Quero um prato de flores
Um vaso de terra
Respirar novos amores
Construir uma casa na primavera

Uma cachoeira e uma lanterna.
Ver a noite desfilando vaga-lumes
O barulho da água feito fechadura
Abrindo portas dessa escura caverna.

Abrir as cortinas
Olhar o calendário sem tristeza
Ver lá fora o que não via
Ser um poema esquecido em cima da mesa...

 

quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

QUANDO TU CHORAS
(Casimiro de Abreu)
Quando tu choras, meu amor, teu rosto
Brilha formoso com mais doce encanto,
E as leves sombras de infantil desgosto
Tornam mais belo o cristalino pranto.

Oh! nessa idade da paixão lasciva
Como o prazer, é o chorar preciso:
Mas breve passa - qual a chuva estiva -
E quase ao pranto se mistura o riso.

É doce o pranto de gentil donzela,
É sempre belo quando a virgem chora:
- Semelha a rosa pudibunda e bela
Toda banhada do orvalhar da aurora.

Da noite o pranto, que tão pouco dura,
Brilha nas folhas como um rir celeste,
E a mesma gota transparente e pura
Treme na relva que a campina veste.

Depois o sol, como sultão brilhante,
De luz inunda o seu gentil serralho,
E às flores todas - tão feliz amante -
Cioso sorve o matutino orvalho.

Assim, se choras, inda és mais formosa,
Brilha teu rosto com mais doce encanto:
- Serei o sol e tu serás a rosa...
Chora, meu anjo, - beberei teu pranto!

quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

CANTO-TE

(Ana Hatherly)

Canto-te para que tu
definitivamente existas.
Canto o teu nome
porque só as coisas cantadas
ealmente são e só o nome pronunciado
inicia a mágica corrente.
Canto o teu nome como o homem
fazia eclodir o fogo do atrito das pedras.
Canto o teu nome como o feiticeiro
invoca a magia do remédio.
Canto o teu nome como um animal uiva,
Como os animais pequenos bebem nos regatos
Depois das grandes feras.

Canto-te,
e tu definitivamente existes
nos meus olhos sempre abertos
porque sempre os meus olhos
são os olhos da criança
que nós somos sempre
diante da imensidão do teu espaço.

Canto-te,
e os meus olhos, sempre abertos,
são a pergunta no instante pendente
de eu te interrogar;
e interrogo as coisas em seu ser noturno,
em seu estar sombriamente presentes
na tua claridade obscura.
E como é sempre,
meus olhos abertos perscrutam-te
símbolo de tudo o que me foge
como apertar o ar dentro das mãos
e querer agarrar-te, oh! substância...

Canto-te
para que tu existas
e eu não veja mais nada além de ti

segunda-feira, 5 de novembro de 2012


ALMAS AZUIS
(Mário Feijó)

Traga-me um pedaço de pão
Meu coração tem fome de ti
Por isto sangra e pulsa
E tu és o alimento que me sustenta

Enquanto isto minh’alma
Beija-flores no jardim
Feito borboleta desassossegada
Recém desossada de seu casulo

Se todas as almas fossem vermelhas
Eu até poderia dizer
Que sangravam por amor

Porém existem almas azuis
Que se misturam
Entre o céu e o mar...

E há almas secas
Que rondam desertos onde perambulei
Agora pulso entre rosas vermelhas
E o azul esverdeado do céu/mar...

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

ONTEM, HOJE, SEMPRE... PROFESSOR
(Gérson Alves)

“O tempo não para”,
Já dizia o poeta...
Tem razão!...
O mundo está cada vez
Mais globalizado:
Internet,
Satélites e mais satélites,
Celulares, sons, imagens,
Games, mp3, mp4, mp5, mp6...
Daqui a alguns segundos
Surgirão outras novidades
“E o povo passa fome”,
Canta outro poeta.
E nesse dia especial,
Confesso minha emoção:
Sempre acreditei
- Desde minha infância -
Na magia daquele pó de giz,
No velho quadro negro da escola,
Na caneta que arrepia,
Na enorme lousa branca
Que não consigo apagar
Da memória...
E guardo comigo a esperança
De cada olhar e sorriso
Dos colegas,
Dos pais,
Dos alunos...
E quando estou em casa,
Nos meus momentos
Mais íntimos de oração
Agradeço!
Sei que é minha missão educar!
Sei que é minha missão despertar
Os alunos para a vida.
Mas, sei que não sou máquina,
Por isso, também vou lutar.
Sou ser humano,
Sou de verdade,
Nada virtual!...
Quero viver e morrer com dignidade.
Estou farto de promessas!...
Entra governo, sai governo
E para nós o que sobra é quase nada...


Parabéns, Professor, pelo seu dia!...

quarta-feira, 10 de outubro de 2012


PARODIANDO CAMÕES
(Gasparino José Romão)

Sete meses no balcão Joaquim servia,
Ao Manoel , português lá da Estrela,
Que transava com a mulata Isabela,
Que era a sensação da Padaria.

Nem um dia o português que a protegia,
Viver no dia a dia assim sem vê-la,
Por isso trabalhava ao lado dela,
Distanciado o morruga padecia.

Certo dia o português que, lá no “Caixa”,
Vinha há muito a suspirar em maré baixa,
Botou Joaquim na rua com bravata.

Joaquim, que sempre fora um cabra macho,
Saiu sem dar estrilo, cabisbaixo,
Vingou do Manoel: levou a mulata!

segunda-feira, 24 de setembro de 2012


DESEJO
(Casimiro de Abreu)

Se eu soubesse que no mundo
Existia um coração,
Que só por mim palpitasse
De amor em terna expansão;
Do peito calara as mágoas,
Bem feliz eu era então!

Se essa mulher fosse linda
Como os anjos lindos são,
Se tivesse quinze anos,
Se fosse rosa em botão,
Se inda brincasse inocente
Descuidosa no gazão;

Se tivesse a tez morena,
Os olhos com expressão,
Negros, negros, que matassem,
Que morressem de paixão,
Impondo sempre tiranos
Um jugo de sedução;

Se as tranças fossem escuras,
 Lá castanhas é que não,
E que caíssem formosas
Ao sopro da viração,
Sobre uns ombros torneados,
Em amável confusão;

Se a fronte pura e serena
Brilhasse d'inspiração,
Se o tronco fosse flexível
Como a rama do chorão,
Se tivesse os lábios rubros,
Pé pequeno e linda mão;

Se a voz fosse harmoniosa
Como d'harpa a vibração,
Suave como a da rola
Que geme na solidão,
Apaixonada e sentida
Como do bardo a canção;

E se o peito lhe ondulasse
Em suave ondulação,
 Ocultando em brancas vestes
Na mais branda comoção
Tesouros de seios virgens,
Dois pomos de tentação;

E se essa mulher formosa
Que me aparece em visão,
Possuísse uma alma ardente,
Fosse de amor um vulcão;
Por ela tudo daria...
— A vida, o céu, a razão!